FICÇÃO CIENTÍFICA

A guerra dos mundos: as adaptações de um clássico da Ficção Científica.

Mais de cem anos depois de sua publicação, A Guerra dos Mundos ainda fascina os leitores de todo o mundo e de todas as gerações. Considerada uma das obras precursoras e mais importantes da ficção científica teve diversas adaptações para as mais diferentes mídias.

Por Paulo Bocca Nunes

O que você faria se, de repente, a Terra fosse invadida por seres de outro planeta ou de outra galáxia? E se os objetivos deles não fossem nem um pouco pacíficos? Qual seria o destino da humanidade?

Quando os olhos das pessoas miram um céu noturno sem nuvens, e veem todas aquelas estrelas, dificilmente deixam escapar uma pergunta: será que existe vida naquelas estrelas? Será que estamos sozinhos nesse universo imenso?

Sendo um gênero literário um tanto controverso para os acadêmicos, a ficção científica faz muitas especulações. Uma das obras mais celebradas pelo fato de ter sido a primeira que trata sobre alienígenas invadindo a Terra, é A Guerra dos Mundos, do escritor britânico Herbert George Wells e publicada em 1898. Inicialmente, a obra foi sendo publicada nas páginas do periódico mensal Person’s Magazine um ano antes. Wells mostrou ser quase um visionário prevendo máquinas, equipamentos e armas que só fomos conhecer muitas décadas depois.

A história fala de uma invasão de marcianos que veio para dominar o planeta. O sucesso foi tão grande que inspirou outras obras literárias que abordam o mesmo tema além de também inspirar adaptações para o cinema, séries de TV e até mesmo de rádio.

O objetivo desse artigo será apresentar essas adaptações, porém vamos fazer inicialmente uma breve passagem pela história original do escritor inglês.

UMA INVASÃO MARCIANA

A história se passa entre o final do século XIX e início do século XX e é contada por um narrador em primeira pessoa e é, portanto, o personagem principal. Em nenhuma parte do livro o narrador é identificado pelo seu nome. Ele mora em um povoado perto de Londres e é convidado a ir a um observatório astronômico para ver uma série de explosões na superfície de Marte. Foi observado que o brilho das explosões se aproximava da Terra. Mais tarde, o que se pensava ser um meteoro que havia caído perto da casa do narrador, na verdade era um cilindro metálico.

O cilindro se abre e lá de dentro saem os marcianos que matam os humanos que se aproximaram com uma bandeira branca e outros que estavam próximos com uma arma que o narrador chamou de RAIO DA MORTE.

O narrador aluga uma carruagem e foge com sua mulher para outra cidade. Lembramos que essa história é de 1898, portanto, o veículo mais comum na época era a carruagem. A mulher fica com um primo e o narrador então retorna para devolver a carruagem, mas iniciam os ataques dos marcianos que construíram uma máquina com tripés metálicos – os tripods.

Os marcianos vão eliminando a resistência militar dos humanos, causando pânico entre as pessoas que fogem apavoradas. Com o passar do tempo vão caindo outros cilindros iguais ao primeiro trazendo mais marcianos para dar início a uma invasão de conquista.

Ao retornar, o narrador encontra a sua cidade destruída e muitas pessoas mortas pelas ruas. Ele busca voltar para a sua mulher, mas os ataques dos marcianos faz com que ele tome outro rumo. A narração passa para a evacuação em massa de Londres, que o narrador atesta saber devido as informações de um parente que lhe contou tudo. Volta depois para o narrador que fica preso em uma casa em ruínas que é destruída pela queda de outro cilindro. Ele passa a observar os costumes dos marcianos, constatando que eles usam os humanos como alimento, absorvendo o seu sangue.

Os marcianos abandonam a cratera e o narrador vai até Londres onde vê que plantas marcianas que foram trazidas começam a murchar e morrer assim como os marcianos. Mais tarde se constatou que os marcianos morreram devido a uma bactéria contra a qual eles não tinham imunidade. O narrador então regressa para sua casa e reencontra a sua mulher.

Em linhas gerais, essa foi a história do livro. À medida que falarmos das adaptações iremos mostrar o que mudou em relação ao livro, mas sem fazermos qualquer tipo de julgamento se bom ou ruim. Temos que lembrar que cada adaptação é uma nova obra e devemos dar essa liberdade ao criador da adaptação. Gostar ou não dela é uma questão de opinião de cada um.

UM BREVE OLHAR SOBRE A HISTÓRIA DO LIVRO

“A Guerra dos Mundos” conta a história da invasão da Terra por marcianos inteligentes, que chegam ao nosso planeta muito bem preparados para destruir a raça humana e dominar tudo. Se observarmos pelo aspecto crítico literário, por ser um escritor britânico, Wells faz da sua obra um instrumento, ou um veículo, para duras críticas à sociedade vitoriana da época.

O autor consegue provocar no leitor reações bastante incômodas quando faz as descrições dos aspectos físicos dos marcianos (pele semelhante a couro molhado) e das armas extremamente letais aos humanos. Duas dessas armas podem ser identificadas: o raio que emite uma forte luz que desintegra as pessoas se assemelha ao raio laser descoberto na década de 1960, e um gás que mata as pessoas pode ser identificado como uma arma química que foi usada durante a Primeira Guerra Mundial, em 1914. Se parecer um tanto ingênuo para nós nos dias de hoje, na época certamente foi uma inovação devido aos detalhes descritivos.

Pela perspectiva de análise sobre a forma como o autor descreve a aniquilação das pessoas e do domínio da Terra, constatamos como sendo uma alusão ao Império Britânico que desde o final do século XVI dominava e colonizava povos do mundo em vários continentes. Também pode ser interpretado como o quase extermínio dos índios norte-americanos pelos colonos ingleses, dos aborígenes australianos e o domínio na Índia e na África ao longo do século XIX, o que ficou conhecido como o Império Colonial Britânico.

No livro, os marcianos começam o avanço de conquista pelas cidades próximas de Londres e, na invasão da capital britânica, não demonstram qualquer tipo de consideração nem piedade pelos seres humanos nem pelas instituições. Os personagens da história ficam aterrorizados com a facilidade com que os atacantes extraterrestres têm para destruir tudo o que veem pela frente e em desmoralizar todo o poderio militar que tenta impedir o avanço do inimigo. Aos poucos, o narrador vai mostrando ao leitor como todos se sentem impotentes e desanimados com o futuro da existência da raça humana. Em alguns personagens há o princípio da loucura e da insanidade, perdendo aos poucos os valores de humanidade. Uma citação do autor no primeiro capítulo deixa muito clara a intenção de Wells em fazer um paralelo com o período histórico:

Antes de julgá-los com demasiada severidade, devemos nos lembrar das destruições totais e implacáveis que nossa própria espécie empreendeu, não apenas contra os animais, como os extintos bisões e dodôs, mas contra as raças humanas inferiores… Somos por acaso tamanhos apóstolos da misericórdia para podermos nos queixar de que os marcianos tenham feito a guerra no mesmo espírito?

Essa visão do autor em refletir sobre a ganância de alguns povos sobre outros, além de ser bastante corajosa faz do romance algo bastante fascinante e faz com que seja um tema atemporal. Não podemos deixar de constatar que ainda nos dias de hoje temos exatamente o mesmo problema, apesar de serem outros atores na questão de domínio sobre outros povos.

Outra abordagem que faz dessa obra bastante perturbadora diz respeito aos vícios humanos. Durante a fuga em massa, o narrador descreve pessoas e situações que dão uma amostra do ser humano em situações difíceis ou desesperadoras que despertam o instinto de autoconservação.

Algumas pessoas carregavam um homem em uma maca e o narrador constata que é um homem rico e muito influente na sociedade, mas ali, naquele momento, era alguém tão frágil na situação em que se encontrava como qualquer. Em outro exemplo, um soldado discutia com um velho que queria levar seus vários vasos de orquídeas, pois, afirmava ele, eram muito valiosos. O narrador discutiu também com o velho que ele precisava escolher pela vida e não pela morte que se aproximava. Tanto o soldado e o narrador deixaram o velho para trás com seus vasos de orquídeas enquanto ele olhava absorto para a nave marciana que se aproximava e destruía tudo. Também houve o caso de um homem que fugia carregando uma mala de dinheiro, mas, ao não conseguir subir uma carruagem (era o veículo da época do autor) ele cai, a mala se abre e ele fica agarrado ao seu dinheiro. As selvagerias que as pessoas praticavam na fuga, cada uma se preocupando apenas consigo, e descritas de forma muito detalhada, nos dão a ideia clara de que o ser humano tem a sua verdadeira face escondida sob o instinto de preservação.

Nesse ponto, o próprio narrador mostra esse lado do ser humano. Quando ele fica soterrado em uma casa com um padre durante dias, depois que uma das naves dos marcianos aterrissou ao lado, quase destruindo tudo, o padre foi perdendo o juízo aos poucos até entrar em desespero ao ver que os marcianos se alimentavam do sangue das pessoas que capturavam. Para não ser encontrado pelos marcianos, o narrador luta contra o padre e esse vem a morrer. Quando já estava em Londres, o narrador afirma que isso não afetava a sua consciência, pois ele estava ali, vivo. Algo que poderia não ter acontecido se ele não tivesse feito algo para impedir o padre de continuar gritando e se desesperando. Por outro lado, a forma como o narrador vai nos narrando a sua trajetória, lutando para voltar a encontrar a sua mulher e em uma forma de como vencer a situação desesperadora em que todos se encontravam, a sua resistência e tenacidade, nos dão a outra face do ser humano ao mesmo tempo que mostra as suas transformações. Em algumas passagens, o narrador usa da palavra como forma confessional e dá ao leitor a liberdade de julgá-lo pelas suas ações que possam não ter sido boas. Ao longo da história, há um ponto de vista antropológico sobre o comportamento humano: em situação de perigo extremo, o ser humano retoma o seu estado primitivo, comportando-se de forma quase selvagem. Porém, ao terminar tudo, com a morte dos marcianos infectados por bactérias terrestres, o narrador retoma plenamente a sua humanidade ao rever a sua mulher que tanto ama.

AS ADAPTAÇÕES DE “A GUERRA DOS MUNDOS”

Houve projetos para filmagens da história de H.G. Wells, no entanto não foram muitos os casos de realizações de fato. As tentativas frustradas conhecidas ficaram a cargo do produtor e diretor Cecil B. DeMille em 1925 e de Alfred Hitchcock na década de 30. As produções conhecidas são de duas transmissões pelo rádio, dois filmes longa-metragem e uma série de TV.

Guerra dos Mundos (1938) – Rádio

Na noite de 30 de outubro de 1938, véspera do Halloween, um programa de rádio causou pânico em parte dos Estados Unidos. O motivo foi uma adaptação do romance de H.G. Wells para rádio teatro, através da Columbia Broadcasting System (CBS), mas de modo a simular uma invasão extraterrestre. Tudo começou com a rádio CBS convidando o grupo teatral Mercury Theatre, de Orson Welles, a fazer um total de 13 apresentações de rádio-teatro. O programa ia ao ar aos domingos às 20 horas. O grupo fazia adaptação de clássicos da literatura e em 30 de outubro foi a vez de A Guerra dos Mundos. A adaptação, produção e direção da peça ficaram a cargo do próprio Orson Welles que, pouco depois se tornou um bem sucedido diretor de cinema.

O programa começou com a música tema do Mercury Theatre on The Air e o anúncio de que o espetáculo daquela noite seria uma adaptação do romance de H.G. Wells. A introdução foi lida pelo próprio Welles que seguiu fielmente a abertura do romance de Wells. Durante mais ou menos meia hora, a transmissão seguiu como uma programação normal de rádio, apenas interrompida por alguns boletins noticiosos. A partir daí, o roteiro segue os acontecimentos que estão no livro. Primeiro, um noticioso de explosões na superfície de Marte, depois sobre objetos caindo em uma fazenda em Grover’s Mill, Nova Jersy. Após essa parte, a rádio voltou a apresentar músicas para ir fazendo interrupções para chamar repórteres que estavam no local da queda de objetos que caíram do céu até culminando com a descrição de máquinas de guerra gigantescas lançando nuvens de fumaça em Nova York. O formato foi de radiojornalismo, algo que passou muito realismo a quem ouvia.

O que causou algum pânico, e pelo que se verificou mais tarde, nem foi tão amplo como se disse na época, foi o fato de que muitas pessoas não ouviram a abertura do programa e ao sintonizarem a rádio na metade do programa, ficavam espantadas. Depois de um breve intervalo, o programa mudou para um formato de rádio-drama mais convencional e segue um sobrevivente que lida com as consequências da invasão até, finalmente, descobrir que os marcianos foram derrotados não por humanos, mas por micróbios. No dia seguinte, ao referir-se ao programa e às consequências entre a população, o jornal Daily News colocou na manchete: “Guerra falsa no rádio espalha terror pelos Estados Unidos”. A transmissão radiofônica original e completa, em inglês, com apresentação de Orson Wells, pode ser ouvida clicando AQUI.

Também há uma versão em português desse original radiofônico de “Guerra dos Mundos”. Na verdade, o texto é a tradução do mesmo programa que teve Orson Welles. Pode ser assistido AQUI

Guerra dos Mundos (1949) – Rádio

O mesmo fato ocorreu no Equador, em 12 de fevereiro de 1949. A encenação de “A Guerra dos Mundos” pela rádio Quito seguiu o mesmo formato jornalístico que a CBS anos antes, trazendo muito realismo à transmissão. Até a polícia foi acionada para ir atrás dos alienígenas. Tudo resultou com a revolta da população quando descobriu que nada era real, inclusive com a rádio sendo incendiada. A rádio ficou fora do ar por dois anos.

Guerra dos Mundos (1953)

Essa adaptação é uma das mais lembradas, até mesmo do filme de 2005, de Spielberg tendo Tom Cruise no elenco. A história inicia com a narração que segue o texto de Wells. Depois corta para uma pequena cidade da Califórnia onde cai um objeto metálico e esférico. Movidas pela curiosidade, as pessoas vão até o local, mas o objeto está muito quente. Para estudar o objeto, chega ao local o cientista Clayton Forrester. Ele acaba conhecendo Sylvia, professora de ciências em uma instituição de ensino local e neta de um padre da paróquia da cidade. O cientista fica na cidade e o objeto vai se modificando até ser uma espécie de nave. As pessoas próximas são atacadas por um raio que as desintegra e causa pânico.

O exército é chamado, mas todo o seu equipamento não é suficiente para derrotar o inimigo. Outros objetos vão caindo e se somando ao primeiro que atacam as cidades e as pessoas, expandindo a destruição e o pânico. No final, os alienígenas são derrotados da mesma forma que no livro, ou seja, ficam infectados por bactérias contra as quais não têm imunidade. Esse filme recebeu o prêmio de melhores efeitos visuais.

Guerra dos Mundos (1971) – rádio

Outra adaptação para rádio  de A Guerra dos Mundos. Dessa vez foi da rádio e TV Difusora, de São Luís do Maranhão em 30 de outubro de 1971. Também seguiu o modelo jornalístico do programa de 1938, mas com algumas adaptações para o Brasil. Assim como nas duas adaptações anteriores para o rádio (1938 e 1949), essa também gerou pânico na população. Segundo a imprensa da época, o Exército e os bombeiros ficaram em alerta. Grande parte do comércio fechou e provocou pânico generalizado entre a população. Por causa disso, depois de encerrada a transmissão, uma patrulha do Exército invadiu a rádio e exigiu sua lacração e a emissora ficou fechada por três dias. Entre as modificações no texto de Wells foi a visita de um cientista ao Maranhão e o pouso de um “estranho objeto” no Campo de Perizes, a única saída terrestre da ilha de São Luís. A fita com a gravação do programa foi guardada por mais de 40 anos. Em 2010, ela foi remasterizada e entregue ao Museu da Memória Audiovisual do Maranhão – MAVAM para nova digitalização e masterização. A gravação original, remasterizada você pode ouvir no YouTube clicando AQUI

Guerra dos Mundos (War of the Worlds) – 1988/1990 – Série de TV

Essa adaptação, uma produção canadense e norte-americana, dá sequência ao filme de 1953. Inclusive as naves que os alienígenas usam nessa série são iguais as do filme. Nessa séria, os alienígenas não foram mortos por causa de bactérias, como está inclusive no livro de Wells, mas ficaram em animação suspensa por vários anos até serem despertados no final dos anos de 1980. A partir daí, os extraterrestres ao invés de matarem as pessoas, passam a dominar e controlar os corpos humanos preparando tudo para a chegada de milhões de invasores do planeta Mor-Tax. Para combater esse novo inimigo é formada uma equipe com uma médica, um gênio em computadores, um especialista em armas e um astrofísico, órfão de vitimas do ataque nos anos 50. O seriado não teve muito sucesso, mas foi exibido entre outubro de 1988 e maio de 1989 com 23 episódios. Para assistir aos dois primeiros episódios com legendas em português, clique AQUI.

Guerra dos Mundos (2005) – Direção de Steven Spielberg

A história está centrada no personagem Ray Ferrier (Tom Cruise), um estivador divorciado afastado de seus filhos e vivem com a mãe que já está casada com outro e grávida. No dia que a ex-mulher deixa os filhos com Ray, o planeta passa a ser atacado por alienígenas que surgem em máquinas (os tripods) que saem do subsolo. Ray pega um carro que não é dele e foge apressado com os filhos enquanto um dos tripods vai dizimando as pessoas pelas ruas, destruindo carros e prédios.

Ray decide ir para Boston onde está a ex-mulher para deixar com os filhos com ela. No caminho, o filho Robbie, um adolescente que não chama Ray de pai, mas pelo nome, mostra toda a sua mágoa pelo ausência paterna. Por todo o trajeto, o jovem mostra a sua vontade lutar contra os alienígenas ao invés de ir a Boston. O grupo passou por várias dificuldades até que, depois de uma travessia fracassada por uma balsa junto com centenas de pessoas, muitos chegam à margem e são atacados pelos tripods. O jovem decide acompanhar os soldados que avançam contra os tripods enquanto Ray pega a filha, Rachel, e é chamado para se abrigar no porão da casa de um homem chamado Harlan.

Depois de algum tempo, a casa é visitada por alienígenas, mas não encontra o grupo. Harlan e Ray descobrem que os alienígenas estão plantando uma planta trepadeira avermelhada e adubada com sangue humano. Harlan fica horrorizado ao ver isso e surta. Ray tenta acalmá-lo para proteger Rachel, mas a agitação de Harlan faz com que Ray se sinta forçado a matá-lo para que seus gritos não atraiam os alienígenas. Mais tarde, um dos tripods pega Rachel, mas Ray consegue subir na máquina e, com ajuda de outras pessoas que também foram pegas pela máquina, consegue explodir com tudo e salvar as pessoas. Ao conseguir chegar em Boston, Ray observa que os tripods começam a mostrar defeitos e a caírem e não funcionarem mais. A porta de um dos tripods abre e o alienígena ali dentro sai, mas morre. Na cena final, a voz de um narrador diz que os alienígenas foram mortos por bactérias da Terra contra as quais eles não tinham defesa. O filme, até a data desse artigo, ainda está disponível em canais de streaming.

Guerra dos Mundos (War of the Worlds) – 2019 – BBC

Minissérie produzida pela BBC lançada em outubro de 2019 planejada para três episódios. A história se passa na primeira década do século XX na Inglaterra e acompanha o casal George e Amy. Os dois mantêm uma relação que não é bem vista pela sociedade. Frustrado e infeliz no casamento, ele se separa da mulher, que não quer lhe dar o divórcio, ao conhecer Amy. Juntos, os dois buscam construir uma nova vida. Principalmente pelo fato de ela já estar grávida. George é um jornalista que vive obscurecido pelo chefe da redação que favorece outro jornalista.

No primeiro episódio, um amigo do casal é astrônomo e os convida para observarem explosões que surgem na superfície do planeta Marte. Certo dia, cai nas proximidades da cidade em que moram um objeto que pensam ser uma espécie de meteorito. George faz fotos para o seu jornal, mas, depois de discutir com o chefe que não aceita a matéria que traz, é despedido. Enquanto isso, um grupo de astrônomos do governo imperial britânico se aproxima do objeto, que se percebe ser uma esfera, e tenta escavar ao redor para fazer estudos. Amy e o amigo astrônomo estão juntos quando o objeto começa a se mover, eleva-se no ar e vai desintegrando todas as pessoas que estão próximas. Os que sobreviveram fogem assustados. O amigo astrônomo do casal aparentemente morre, pois não é mais encontrado. Amy e George se encontram, tentam fugir do ataque de um tripod, mas se separam por um acidente. Amy vai ao encontro do irmão de George que, mesmo não gostando dela por ter sido o motivo da separação de George e de sua mulher, a acolhe.O episódio Nº 1 pode ser assistido no YouTube clicando AQUI e o episódio Nº 2 AQUI.

Guerra dos Mundos (War of the Worlds) – 2019 – Fox/Studio Canal

A ação e a história estão situadas na Europa contemporânea. Astrônomos encontram uma transmissão que prova a existência de vida fora da Terra. Porém, ninguém esperava que o contato alienígena aconteceria de forma rápida e violenta. Extraterrestres invadem o planeta e a humanidade é exterminada em questão de dias, deixando poucos sobreviventes. Assim, a atração acompanha esses grupos vivendo em uma Terra totalmente deserta. A sinopse da série diz também que a história é o mote para observarmos como as relações humanas mudam em um cenário apocalíptico e na forma como o instinto de sobrevivência provoca reações estremadas que podem levar o ser humano a um estado de selvageria. No YouTube há trailers, mas a estreia dessa série no Brasil ainda não está certa. Assista um trailer com legendas em português clicando AQUI

CONCLUSÃO

De um modo geral, todas as adaptações buscaram trazer as reflexões sobre a condição humana em momentos de grande tensão perante situações que abalem o emocional e o psicológico, levando o ser humano a uma condição de um quase retorno ao seu estado primitivo.

O narrador, ao longo da narrativa, não faz julgamentos diretos aos invasores marcianos, pois, segundo a sua própria reflexão, o ser humano já usou do expediente de extermínio de um povo sobre outro. Citou inclusive a própria Inglaterra que, historicamente, expandiu um vasto império por todos os continentes.

O trabalho de Orson Welles, em 1938, não buscou provocar essas reflexões. Mas, ao dar um formato de jornalismo, simulando que tudo estava realmente acontecendo em alguma parte dos Estados Unidos, provocou reações muito sérias no público que ouvia e não estava informado sobre o que estava acontecendo. Essas reações, de certa forma, mostrou na prática algo um tanto próximo do que o narrador do livro descrevia, ou seja, pânico e desespero. Porém, o objetivo do futuro diretor de cinema, era apenas o entretenimento. Se é que podemos dizer isso depois de toda a confusão causada naquela época.

O mesmo se pode dizer sobre as transmissões de rádio em 1949 e 1971. Seguiu o mesmo formato jornalístico e trouxe confusões entre o público desavisado. Pode se ver nos três casos o poder do rádio e a sua influência na audiência. Apesar de todas as inovações tecnológicas, ainda hoje o rádio tem todo esse poder de chegada no público. Nem todos os lugares podem ter condições de levar as transmissões de TV, mas o rádio sempre estará presente nas localidades mais distantes.

O filme de 1953 pouco trouxe do texto original. Sequer os alienígenas foram representados pelos famosos tripods, mas pequenas naves espaciais. Algo que deve ser destacado nesse filme foi o uso de uma bomba atômica para tentar destruir os marcianos e sem sucesso. e sob esse aspecto, a localização no tempo é diferente do livro, pois enquanto a história desse se passa no início do século na Inglaterra, o filme está ambientado nos Estados Unidos na década de 1950.

Se na história de H.G. Wells, o narrador deixa a mulher e passa a viver a sua jornada contra os marcianos, no filme vai surgindo um relacionamento entre o cientista e a sobrinha do padre da cidade. A forma como os dois se desencontram no filme, em nada tem de igual ao livro, mas é bastante envolvente como ele vai em busca da garota para salvá-la e protegê-la, algo que ficou muito interessante. No livro, o narrador volta pra casa e de repente a sua mulher retorna para procurá-lo e por uma questão de sorte se reencontram. O que realmente colocou o livro e o filme lado a lado foi o fato de os alienígenas terem sido vencidos por bactérias do nosso planeta.

A série de TV de 1988/1990 buscou dar um seguimento à história de Wells. Para isso, a informação ao espectador é de que os alienígenas não morreram, mas ficaram em estado de hibernação suspensa. Um argumento que pode ser meio fraco ou, ao menos, desconstrói a narrativa de H.G. Wells. Além disso, os conflitos internos levam a série a se confundir, principalmente pelo fato de, logo no primeiro episódio, haver um xamã de um povo indígena norte-americano usar uma bastão com um cristal que lhe dá poderes de controlar as forças da natureza. E sobre isso ainda, esse mesmo xamã diz que seres de outros planetas entraram em contato com os ancestrais dele e lhe passaram conhecimentos que ele ainda traz e domina. Portanto, trata-se de magia ou de ficção científica?

O filme de Spielberg, de 2005, trouxe muitas referências do livro. Entre esses podemos citar a travessia de barco e o ataque dos tripods, a luta entre Ray e o homem que entra em desespero lembra bastante a luta do narrador do livro com o padre, todas essas ambientadas em uma casa. Nos dois casos o motivo do desespero foi o mesmo, ou seja, foi descoberto que os alienígenas sugavam o sangue das pessoas ou se alimentavam dele. A forma como os tripods surgiram não lembra o que foi colocado no livro. Pelo filme, os alienígenas já estavam aqui na Terra só esperando o momento certo para iniciar a conquista do planeta. Por outro lado, levou a história sob o ponto de vista do personagem Ray de tal forma que muito se aproxima do narrador do livro de Wells. Inclusive algumas reflexões sobre a situação que todos estão vivendo. Não tão profundamente, pois o narrador do livro era um intelectual e escritor. Ao passo que as reflexões de Ray eram limitadas até mesmo pelo fato de ele se representado como um homem não muito bem sucedido, que morava em uma casa muito humilde de subúrbio. Pelas suas ações com os próprios filhos se mostrava ser um homem até certo ponto um pouco bruto e nem um pouco intelectual.

O final, é claro, seguiu o mesmo do livro. Os alienígenas foram derrotados por bactérias e não pela ação efetiva de resistências das forças militares. Trazendo uma forte relação com o livro, no começo do filme a câmera vai mostrando vários micro-organismos que, à medida que a câmera recua, percebemos que tudo está dentro de uma gota de água sobre uma folha. Um narrador traz o mesmo texto do início do livro de Wells, assim como no final do filme. A sucessão de imagens dos micro-organismos se confundindo como um microuniverso e depois em um universo expandido causa um impacto no espectador.

A série da BBC parece trazer mais impacto por fortes referências ao texto original. Muitas das reflexões do narrador vêm ao espectador através das falas do personagem George. Principalmente pelo fato de essa adaptação estar ambientada na Inglaterra, como no livro. No romance, o narrador vive todas as dificuldades devido à invasão alienígena, enquanto na série George divide as dificuldades com sua mulher. No entanto, é dele as palavras que fazem o seu irmão se indignar. George se pergunta se tudo não seria uma forma de castigo pelo fato de a Inglaterra ter sido um país dominador por tantos anos, invadindo e conquistando territórios. Seu irmão rebate todas essas acusações e não leva a sério o que diz George, mesmo que, algum tempo antes disso, ele tenha ouvido do próprio primeiro ministro inglês a necessidade de capturarem-se aquelas máquinas extraterrestres para servir de armas para a expansão inglesa até mesmo para outros planetas. De forma perturbadora, a série ainda mostra a Terra em um tempo após a vitória sobre os alienígenas e como os humanos lutam para sobreviver. Pode ser que essa série seja a mais interessante de todas as adaptações até então feitas sobre o livro de H.G. Wells.

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Paulo Bocca Nunes é professor de Língua Portuguesa e Literatura. Mestre em Letras, Cultura e Regionalidade. Especialista em Literatura e Cultura Portuguesa e Brasileira. Especialista em Cultura Indígena e Afro-brasileira. Escritor. Contador de histórias.