O Primeiro Robô de Isaac Asimov, anunciando a inteligência artificial
Os robôs sempre foram criação de ficção científica. Nas primeiras histórias o conflito principal era a preocupação de uma revolta das máquinas contra os humanos. Então veio Asimov trazer as 3 Leis da Robótica.
Paulo Bocca Nunes
Isaac Asimov é um dos Grandes Mestres da Ficção Científica de todos os tempos. Sua obra, iniciada no final da década de 1930, aos poucos foi integrando um dos elementos mais representativos do gênero literário, que depois encontrou morada em filmes: os robôs. Na época da juventude de Asimov, essas obras da criação humana causavam estranheza e desconfiança, até mesmo medo. Durante a segunda metade do século XX, os robôs eram vistos como um avanço tecnológico inevitável e de grande utilidade em indústrias. Porém, a desconfiança retornou na nossa atual sociedade com a evolução da Inteligência Artificial.
Antes de Asimov, histórias sobre robôs apresentavam as máquinas como um perigo para a humanidade bem ao estilo Frankenstein: a criatura voltando-se contra o criador. Um exemplo que ficou bastante conhecido é a obra do escritor tcheco Karel Capek (1890-1938) e sua peça teatral R.U.R. (Rossumovi Univerzální Roboti) que introduziu a palavra “robô” tanto na ficção quanto na ciência. A peça estreou em janeiro de 1921 e a história trata de autômatos de aparência humana criados por um cientista chamado Rossum. Na peça, os autômatos eram chamados de “robota” e desenvolvem trabalhos pesados. Em certo momento, os robôs fogem do controle humano, desenvolvem sentimentos próprios e terminam por destruir a espécie que os criou. Esse aspecto humano está muito relacionado com o que conhecemos hoje por Inteligência Artificial.
Quando iniciou suas histórias sobre robôs, a intenção de Asimov não era criar uma sequência de histórias interligadas entre si, criando um universo ficcional sobre o tema. No entanto, a sua formação científica e o seu interesse sobre os avanços científicos na área foram sendo integrados às suas histórias. Houve também um elemento motivador: o conto Eu, Robô, dos irmãos Binder, publicado em Amazing Stories, de abril de 1939. Há outro conto que influenciou Asimov (O satélite Jameson, de Neil R. Jones), publicado na revista Amazing Stories (julho de 1931 e novamente na edição de abril de 1956).
Inspirado nessas histórias, Asimov escreveu o seu conto Strange Play Fellow, escrito como uma história independente. No entanto, no ano seguinte o escritor passou a publicar uma série de histórias adicionais de robôs, que se encaixam em uma narrativa que foi então reunida na coletânea Eu, Robô.
ROBBIE, O PRIMEIRO ROBÔ DE ASIMOV
Asimov escreveu seu conto em maio de 1939, mas a publicação aconteceu, depois de algumas negativas, na Super Science Stories de setembro de 1940. O editor, John W. Campbell, no entanto, decidiu trocar o título de Robbie para Strange Play Fellow, algo que desagradou a Asimov.
A história teve duas versões. A primeira nos apresenta a história ocorrendo em 1982, quando um robô mudo da série RB, chamado de Robbie, é de propriedade da família Weston para servir de babá da garotinha, Gloria, filha do casal. A Sra. Weston fica preocupada com o efeito que uma babá robô poderia ter em sua filha, já que Gloria tem mais interesse em brincar com Robbie do que com as outras crianças e pode não aprender as habilidades sociais adequadas. A Sra Weston consegue então convencer o marido a se livrar de Robbie, que o devolve Robbie à fábrica.
Glória era muito apegada ao robô e o afastamento fez com que ela ficasse muito triste, deixasse de sorrir e ser feliz. Os pais compraram um cachorro no intuito de alegrar a filha, mas ela estava decidida a ter de volta seu amigo de metal. Com a intenção de ajudar a filha, a Sra. Weston convence o marido a se mudarem para Nova York, onde ele trabalha, e assim dar novos ares à garota. Glória acredita, no entanto, que todos estão indo em busca de Robbie.
O casal leva a filha a diversos lugares, mas Glória só pensa em Robbie. O Sr. Weston decide levar a filha até uma fábrica que constrói robôs, pois acredita que a garota vê Robbie não como um robô, mas uma pessoa. Com esse gesto, ele diz imaginar que Glória verá que os robôs são apenas máquinas. A Sra. Weston concorda e durante a visita na fábrica da Finmark Robot Corporation, eles entram numa sala onde os robôs constroem outros robôs, todos têm uma enorme surpresa e uma situação bastante perigosa muda toda a história.
A segunda versão aconteceu quando Asimov introduziu esse conto na coletânea Eu, Robô, de 1950. Houve várias alterações, entretanto, as mais consideráveis e importantes são:
- A data é alterada para 1998 quando a história acontece
- A introdução de Susan Calvin, que será fundamental no universo dos robôs de Asimov. Essa última mudança irá se refletir em toda a série dos robôs de Asimov, inclusive na série da Fundação.
OS ROBÔS E A INETLIGÊNCIA ARTIFICIAL SOB ANÁLISE
Toda a obra de Asimov traz muitas histórias sobre robôs. Nem todas estão interligadas dentro de um universo. Isso só foi surgindo com o tempo, à medida que suas histórias iam evoluindo dentro de um universo criado aos poucos e de acordo com o sucesso de seus livros. Não era, portanto, seu projeto inicial.
As primeiras histórias mostram a visão que Asimov tinha das máquinas. Na verdade, ele não as via como algo perigoso ou que exercesse competição com o ser humano. Para o escritor, a máquina era um elemento que deveria agregar coisas boas que servissem de conforto às pessoas. Inclusive para controlar um possível perigo para os humanos foram criadas as Três Leis da Robótica.
Em suas obras, Asimov trouxe inovações científicas e tecnológicas, sendo que algumas de algum modo se confirmaram, excedendo as expectativas. No entanto, tudo o que o seu espírito visionário de escritor de ficção científica apresentou aos leitores fez parte da realidade de seu tempo. Sob esse aspecto está o caso dos robôs e os seus cérebros positrônicos, que atualmente reconhecemos como Inteligência Artificial.
O interesse de Asimov em trazer histórias que tratem de um possível confronto entre humanos e máquinas, criando as Três Leis da Robótica, é revivido na sociedade atual do século XXI. Mais do que nunca, o assunto Inteligência Intelectual e a forma como ela se integra na sociedade faz parte dos debates científicos ou de pessoas interessadas no assunto.
Durante o ano de 2022, algumas notícias assombraram o mundo quando cientistas apresentaram robôs capazes de desenvolver uma mentalidade própria. O que poderia fazer uma máquina como essa? Outros robôs atuais são capazes de mostrar expressões humanas que condizem com sentimentos humanos.
Em relação ao conto de Asimov, a preocupação da mãe de Glória era o fato de a filha ver Robbie como uma pessoa e não uma máquina. Em Robbie, o personagem é apenas um conjunto de metal de uma geração anterior aos robôs positrônicos. Por outro lado, os robôs atuais com inteligência artificial são criados de tal forma que já possuem rostos que podem ser expressivos.
Multiplicam-se os artigos em plataformas que tratam de tecnologia e debatem sobre a eficiência dessas três leis sobre a Inteligência Artificial que já é uma realidade. Essa inteligência obedeceria essas Leis em um momento crucial? Como introduzir essas Leis em uma máquina que já domina uma forma própria de mentalidade? Sob essa ótica, podemos fazer um paralelo entre a preocupação da mãe da pequena Glória, do conto de Asimov, com o que se debate hoje sobre a inteligência artificial.
Logicamente, a tecnologia que Asimov imaginava em suas histórias não se compara com o que temos hoje. Entretanto, se o autor, ainda jovem, não tinha a intenção de trazer um debate sobre a tecnologia dos robôs, é evidente que ele adiantou-se muito em uma previsão tecnológica bastante complexa.
Assista ao vídeo sobre esse mesmo artigo, que está no Youtube. Aproveite e se inscreva no canal, acione as notificações, curta o vídeo e deixe o seu comentário.
Paulo Bocca Nunes é professor de Língua Portuguesa e Literatura. Mestre em Letras, Cultura e Regionalidade. Especialista em Literatura e Cultura Portuguesa e Brasileira. Especialista em Cultura Indígena e Afro-brasileira. Escritor. Contador de histórias.