Ad Astra: Ficção Científica Filosófica
Uma aventura pelo nosso sistema solar e entre uma estação espacial e outra, uma pausa para pensamentos e divagações cerebrais e filosóficas. Também se mostra uma tentativa de personagens resolverem seus questionamentos existenciais e familiares. O fim é descobrir quais são as prioridades na nossa vida.
Paulo Bocca Nunes
Ad Astra é um filme de aventura e ficção científica norte-americano de 2019, com a produção e direção de James Gray, que também divide o roteiro.
Depois que uma estação espacial sofre um acidente por descargas eletromagnéticas, o astronauta Roy McBride (Brad Pitty) é convocado pela US Space Command (SpaceCom) para uma missão rumo ao planeta Netuno. A alta cúpula da instituição espacial acredita que os problemas podem ter relação com o projeto Lima, comandado pelo pai de Roy, Clifford McBride.
O projeto foi criado 29 anos antes e Clifford estava na liderança e o tinha por objetivo encontrar vida inteligente na galáxia. Uma expedição desse projeto foi enviada a Netuno para fazer as pesquisas, mas não houve contato com a tripulação desde que a nave chegou ao planeta 16 anos atrás. Roy é informado de que seu pai pode estar vivo e concorda em viajar para Marte, de onde faria a tentativa de estabelecer contato com o pai.
Roy é constantemente avaliado psicologicamente e sua calma e frieza, mesmo nos momentos mais tensos, faz com que ele seja a pessoa ideal para uma missão tão perigosa. Exatamente essa capacidade de manter ao máximo o seu controle emocional, também faz com que ele mostre pouca reação emocional à possibilidade de seu pai estar vivo.
Ad Astra é um filme que concorre em si mesmo gêneros diferentes. O ambiente em que ocorre toda a história nos leva ao campo da ficção científica. Estão ali astronautas, naves e estações espaciais, planetas do sistema solar, tecnologia altamente desenvolvida. Perseguições na Lua ao estilo ópera espacial, thriller de terror em uma nave espacial com dois babuínos perigosos, que lembra Alien o Oitavo Passageiro (1979), balé espacial ao estilo 2001, Uma Odisseia no Espaço (1968), além do intimismo na solidão do espaço desse filme e de outros como Gravidade (2013) e Interestelar (2014).
No entanto, também reúne elementos de filmes que tratam apenas da vida de pessoas comuns nos mais sórdidos bairros da periferia de qualquer metrópole. O abandono paterno, a mágoa de um filho ou uma filha, a relação familiar esgotada e tensa. As dificuldades de lidar com um passado que interfere no presente e deixam aberto um futuro que não apresenta prioridades para viver uma vida que é única e apenas ela bastaria por si mesma se houvesse prioridades que valessem a pena.
O filme também faz fortes apelos filosóficos sobre a possibilidade da existência de vida fora da Terra e de como nos vemos diante de um universo sem fronteiras, desconhecido, misterioso. Aliado a isso, o intimismo das relações afetivas e da busca por soluções que unem dois universos: o interior, fechado e limitado a cada um, e o cósmico, onde o vácuo e o imenso vazio, não apenas não tem a presença de oxigênio e assim serve como uma metáfora, como também não permite a propagação de um grito que nunca será ouvido por ninguém.
Não é à toa que o diretor James Gray centrou a história no desenvolvimento do personagem Roy. Desde trazendo alguns flashbacks da infância do futuro astronauta, passando pelas reações (ou não reações) do personagem em situação de extensão até os exames psicológicos que passava e sobre o que pensava sobre a sua relação com sua mulher. Apesar de ter dificuldade em externar sentimentos, isso não faz de Roy um sujeito sem sensibilidade, como é demonstrado no momento em que a nave em que está recebe uma mensagem de socorro e, ao contrário do comandante, Roy quer verificar o que se trata, mesmo sabendo da prioridade de sua missão.
Essa busca pela construção da personagem, fez com que algumas cenas parecessem ter sido incluídas apenas para dar uma sacudida na trama, buscando uma ação mais movimentada. Talvez não fizessem falta se não estivessem no filme. É o caso das cenas de perseguição na Lua, da sequência da nave que pede socorro e da travessia dos anéis de Netuno. Essas sequências quase destoam do restante do filme.
Provavelmente, o final tenha sido um tanto frustrante. Ao longo do filme vemos um personagem imerso em seus pensamentos, seus questionamentos, seu passado conflituoso que convivia com a ausência do pai. Enquanto o pai era visto como um herói, o maior astronauta de todos os tempos, Roy tinha uma visão diferente da mesma pessoa. Exatamente isso fez com que se tornasse desapegado das relações humanas mais fortes. Mesmo que a sua trajetória o tivesse levado a reflexões contrárias ao fim de tudo, algo mostrado apenas pela sua narração, tudo se encerra de forma bastante rápida, apesar de ter se passado tanto tempo desde que partiu em direção a Netuno.
Ad Astra deve ser assistido como uma obra em si, sem comparações com clássicos do cinema de ficção científica. As cenas que realçam o gênero de ficção científica, como a estação espacial sobre a Terra e as estações na Lua e em Marte, são muito bem feitas. Os efeitos especiais completam um filme que teve bom roteiro, apesar de alguns deslizes, e uma direção bastante eficaz. Brad Pitt conseguiu trazer uma boa carga dramática ao seu personagem, apesar de não ter sido uma de suas principais atuações. Tommy Lee Jones, que dá vida ao pai de Roy, da mesma forma constrói um personagem que está tão envolvido nos seus conflitos internos, movidos pelo seu projeto de vida, quanto os do próprio filho.
O filme está disponível desde janeiro de 2023 na plataforma da Netflix.
FICHA TÉCNICA
DIREÇÃO: James Gray
ROTEIRO: James Gray E Ethan Gross
ELENCO: Brad Pitt, Tommy Lee Jones, Ruth Negga, Liv Tyler e Donald Sutherland.
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Paulo Bocca Nunes é professor de Língua Portuguesa e Literatura. Mestre em Letras, Cultura e Regionalidade. Especialista em Literatura e Cultura Portuguesa e Brasileira. Especialista em Cultura Indígena e Afro-brasileira. Escritor. Contador de histórias.