Foundation: A Terceira Crise É Fundamental
Comerciantes, Império, o Mulo e o Destino de Gaal Dornick
A terceira temporada de “Foundation” chega com força total, colocando a galáxia à beira do colapso. Em jogo estão o futuro da Fundação, o poder do Império e a imprevisível presença do Mulo. Mas há um detalhe ainda mais intrigante: Gaal Dornick pode ser a chave para salvar — ou perder — tudo.
Paulo Bocca Nunes
A PSICOHISTÓRIA EM CRISE
Desde os primeiros episódios da série, acompanhamos o plano traçado por Hari Seldon para preservar o conhecimento humano diante da queda inevitável do Império Galáctico. A psico-história prevê eventos em larga escala, mas não consegue lidar com desvios individuais imprevisíveis. As chamadas “crises” marcam momentos decisivos, onde o plano de Seldon precisa ser reafirmado — ou pode ser completamente destruído.

Estamos agora diante da terceira crise, um momento crítico tanto nos livros quanto na adaptação da Apple TV+. No universo original de Isaac Asimov, essa crise ocorre em 135 EF (Era da Fundação), ou 12.203, segundo o calendário imperial. Já na série, o mesmo evento se desenrola muito mais tarde: no ano 12.392. Esse deslocamento temporal mostra que o plano já não segue o rumo previsto.
COMERCIANTES: INSTRUMENTOS OU AMEAÇA?
Nos livros, os comerciantes desempenham um papel crucial ao substituir a dominação religiosa da Fundação por uma influência econômica mais sutil e poderosa. São eles que espalham a tecnologia da Fundação pelas bordas da galáxia, criando dependência e ampliando sua influência.
O personagem Hober Mallow, em especial, representa essa virada estratégica. Inteligente, calculista e carismático, Mallow entende que o poder comercial pode ser tão eficaz quanto o militar. Na série, há um descendente de Hober Mallow — um nome carregado de peso — mas com uma personalidade e papel bem distintos. Ele é impulsivo, caótico e até cômico, mas não menos perigoso.

Outro ponto importante: na série, o Império decide fornecer armas aos comerciantes. Isso altera completamente o equilíbrio de forças e coloca a Fundação em risco real de destruição. Esse elemento não existe nos livros e revela a inclinação da série para uma abordagem mais militarizada e dramática.
DEMERZEL E A RUÍNA DO IMPÉRIO
Demerzel, a misteriosa conselheira imperial, guarda segredos que vão muito além do que os Cleons imaginam. Com acesso ao Prime Radiante, ela também compreende os riscos da terceira crise — e sabe que o Império pode ruir junto com a Fundação.
Em temporadas anteriores, vimos sua verdadeira natureza robótica e sua ligação com Seldon. Agora, ela parece dividida entre manter o Império ou preservar o plano. Essa dualidade pode ser fatal, pois sua interferência — ou omissão — afetará diretamente o curso dos eventos.
GAAL DORNICK: DE BIÓGRAFA A PROTAGONISTA
Nos livros, Gaal Dornick é um jovem matemático vindo do planeta Synax. Ele participa do julgamento de Hari Seldon e da preparação para a fundação da colônia em Terminus. Depois disso, desaparece da narrativa, sendo citado apenas como o maior biógrafo de Seldon pela Enciclopédia Galáctica.
Mas na série, Gaal Dornick é muito mais do que um coadjuvante histórico. Ela se torna o ponto de vista da narrativa — narra em off a trajetória dos eventos — e, principalmente, se torna protagonista de uma reviravolta dramática.
Em vez de ser acordada da criogenia um ano após os eventos do julgamento, como havia combinado com Seldon, ela desperta 152 anos depois. Todos estão mortos. Apenas Hari Seldon, agora velho, ainda vive. E ele revela algo crucial: Gaal deveria ter morrido na Deliverance. Sua sobrevivência mudou completamente o rumo da história.

Mais ainda: Gaal descobriu na segunda temporada que possui poderes mentais latentes, desenvolvidos entre os mentálicos, um grupo que, nos livros, aparece discretamente em Prelúdio à Fundação, mas que na série ganha destaque como uma nova força com habilidades psíquicas.
Se nos livros Dornick é um observador e biógrafo, na série ela é a peça que pode reequilibrar — ou destruir — a psicohistória. É como se o roteiro dissesse: “A história não é mais sobre Seldon. É sobre ela.”
MENTÁLICOS: SOLUÇÃO OU NOVA AMEAÇA?
Na obra de Asimov, os mentálicos são raros e aparecem quase como uma ideia que Seldon considera durante sua jornada em Trantor. Já na série, formam uma sociedade isolada, com poderes mentais capazes de manipular emoções, prever probabilidades e agir fora dos limites da psicohistória tradicional.

É nesse contexto que Gaal e Salvor se envolvem — e, mais do que isso, que o surgimento do Mulo se torna uma ameaça real. Afinal, o Mulo é, nos livros, o maior inimigo da psicohistória. Um ser com poderes mentais que rompe todas as previsões.
A série antecipa o surgimento do Mulo (que nos livros aparece apenas após a quinta crise), indicando que o plano de Seldon não apenas foi desviado… mas talvez esteja condenado.
E AGORA?
Gaal e Seldon sabem que têm apenas quatro meses para reestabelecer a linha da psicohistória. Se falharem, o Império cairá, a Fundação poderá ser destruída, e o futuro da humanidade será mergulhado em trevas por milênios.
A cada episódio, a série se afasta dos livros, mas constrói uma tensão própria, com escolhas ousadas e consequências imprevisíveis. Resta saber se o público aceitará essa nova trajetória — e se a essência da psicohistória, com ou sem Seldon, será preservada.
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Paulo Bocca Nunes é professor de Língua Portuguesa e Literatura. Mestre em Letras, Cultura e Regionalidade. Especialista em Literatura e Cultura Portuguesa e Brasileira. Especialista em Cultura Indígena e Afro-brasileira. Escritor. Contador de histórias.