Os primeiros homens na Lua, de H.G. Wells – adaptações para tv e cinema
Um dos autores mais consagrados do gênero de ficção científica, H. G. Wells contribuiu com obras que se tornaram clássicas do gênero. Uma delas é The First Men in the Moon, ou como ficou conhecido no Brasil, ‘Os primeiros homens na Lua‘.
Paulo Bocca Nunes
Depois do sucesso de A Guerra dos Mundos (1898), H. G. Wells trouxe a público outra obra de um gênero que ele mesmo denominou de “Romance Científico”. Os primeiros homens na Lua (The First Men in the Moon) foi inicialmente publicado entre dezembro de 1900 e agosto do ano seguinte na revista britânica The Strand Magazine. O livro foi publicado em edição com capa dura em 1901.
A história apresenta dois protagonistas: o empresário Sr. Bedford, que é o narrador, e um cientista um tanto excêntrico, Sr. Cavor. No romance tudo começa quando Bedford se retira para o campo para escrever uma peça de teatro. Ela aluga uma casa para trabalhar em paz, mas todas as tardes um vizinho faz barulhos estranhos. Depois de algum tempo, Bedford vem a conhecer Cavor e os dois fazem amizade. Cavor está desenvolvendo um novo material, que ele chamou de cavorite, que pode anular a ação da força da gravidade.
Ao ver os bons resultados da experiência, Bedford percebe uma boa forma de enriquecer vendendo o produto, enquanto Cavor tem a ideia de fazer uma nave espacial esférica feita de “aço, forrada com vidro” e com “janelas ou persianas” e usando o cavorite. Bedford é convencido a participar da aventura e, depois de um tempo construindo a nave, eles partem rumo à Lua.
Quando a nave pousa na superfície lunar, eles encontram uma paisagem desolada, mas à medida que o Sol vai surgindo, a atmosfera vai se vaporizando e estranhas plantas começam a crescer de forma muito rápida. Bedford e Cavor saem da nave e se perdem no meio da selva. Em certo momento, surgem seres estranhos em forma de insetos, que eles chamam de selenitas, que prendem os dois. Esses seres fazem parte de um complexa e organizada sociedade tecnologicamente sofisticada, que vive no subsolo da Lua.
Bedford e Cavor fogem do cativeiro e descobrem abundância de ouro na superfície da Lua. Os dois se separam para encontrar a nave. Bedford a encontra, volta para buscar Cabor, mas esse machucou a perna e foi capturado pelos selenitas. Bedford volta para a Terra.
Cavor consegue enviar mensagens para Bedford, relatando muitas coisas sobre a sociedade dos selenitas, mas as transmissões, de repente, pararam. Bedford nunca mais teve notícias do cientista.
ADAPTAÇÕES PARA O CINEMA
Alguns pesquisadores incluem um filme de 1902 como sendo a primeira adaptação do livro de H. G. Wells por encontrarem elementos da obra do escritor britânico. Por outro lado, há quem afirme que há elementos também da obra de Júlio Verne, Da Terra à Lua (1865). O que se pode dizer é que na obra de Verne a ideia de ir à Lua é de um aventureiro francês chamado Michel Ardan. É construído um projétil gigante, oco por dentro para servir de nave, que é arremessado por um enorme canhão. Com Ardan vão outros dois “astronautas”. No livro, os “astronautas” não retornam e Verne fez uma continuação em 1869 para contar a história do retorno dos três aventureiros.
Sobre a obra de Wells, conforme já dissemos, são dois homens e a técnica utilizada para fazer os dois irem à Lua foi totalmente inventada. Isso trouxe duras críticas de Verne, pois ele usou de conhecimentos científicos e elementos do mundo real para criar a viagem à Lua, enquanto Wells “inventou” uma técnica inexistente e só estava na imaginação de seu autor.
O filme de 1902 tem muitos elementos da obra de Verne. A começar pelo projétil e o canhão. Diferenciando dos dois autores, o filme mostra seis astrônomos se aventurando em um projétil enorme e pousando na Lua, tendo que enfrentar seres que viviam no subsolo lunar. Só por isso, já há um elemento da obra de Wells, porém não parece ser o suficiente para se dizer que é uma junção das duas obras. Com certeza, o roteirista e diretor Georges Méliès usou de sua criatividade para fazer uma adaptação livre inspirada mais em Júlio Verne.
1919
Infelizmente, esse filme é considerado como perdido, pois não se sabe o que possa ter acontecido com ele. O que se sabe é que foi uma adaptação muito próxima do livro de Wells.
No filme, Rupert Bedford, um especulador ganancioso, e Samson Cavor, um velho inventor-cientista, vão à Lua em uma esfera revestida com cavorite, uma substância que tem a propriedade de neutralizar a lei da gravidade e foi inventada pelo cientista. Depois de estranhas aventuras com os selenitas, os habitantes da Lua, Bedford abandona o professor e retorna à Terra sozinho para fazer fortuna com o cavorite. Por meio de telegrafia sem fio, no entanto, Hogben, um jovem engenheiro apaixonado pela sobrinha de Cavor, Susan, consegue entrar em contato com o inventor encalhado, que denuncia Bedford e afirma que foi recebido amigavelmente pelo Grande Lunar, suserano do Selenitas. O filme teve roteiro de R. Byron Webber e a direção de Bruce Gordon.
1964
Com roteiro de Nigel Kneale e direção de Nathan Juran, The first man in the moon é uma adaptação livre da obra de Wells. Faz um emaranhado de elementos e referências ao livro com grandes pitadas de criatividade. O filme contou com efeitos de animação em stop-motion de Ray Harryhausen, que incluem os Selenitas, as “Vacas da Lua” gigantes e o Grande Lunar de cérebro grande.
A história começa em 1964 quando um grupo de astronautas da ONU chega à Lua acreditando serem os primeiros. Porém, eles encontram uma bandeira e uma inscrição com o nome de Katherine Callender reivindicando a Lua para a rainha Vitória. Ao ter o nome rastreado, as autoridades da ONU descobrem que ela morreu, mas seu marido, Arnold Bedford ainda vive em uma casa de repouso. Os representantes da ONU vão vê-lo, pedem para que ele fale o que sabe sobre a Lua e Bradford conta sua história.
Há uma regressão no tempo, levando para 1899. Bedford mora numa casa próxima do campo. Ele recebe a visita de sua noiva, Katherine Callender. Bedford conhece seu vizinho, Joseph Cavor, que conta ter inventado uma substância chamada cavorite. Ela tem a capacidade de anular a força da gravidade. Cavor convence Bedford a ir com ele até a Lua, pois lá tem muitas pepitas de ouro. Foi construída uma nave esférica com cavorite. A nave é arremessada com os três e chegam à Lua.
Ao explorar a Lua, Bedford e Cavor encontram seres parecidos com insetos e há confronto. Os selenitas aprendem o idioma inglês e o Grande Lunar, o governante dos selenitas, indaga Cavor, que pensa que eles querem trocar conhecimento científico. Bedford não apoia a ideia e tenta matar o Grande Lunar. Bedford decide ir embora com Katherine. Cavor fica por vontade própria. Os astronautas da ONU descobrem a cidade dos selenitas, mas tudo está destruído.
2010
A produção britânica da BBC buscou ser o mais fiel possível à obra de H. G. Wells, no entanto, o roteirista Mark Gatiss usou de sua liberdade criativa para Damon Thomas dirigir o filme.
Em julho de 1969, Julius Bedford, de 90 anos, conta ao jovem Jim a história de dois homens que fizeram a primeira viagem à Lua em 1909. Ele conta que quando jovem, conheceu o Professor Arthur Cavor e que ele havia inventado “cavorite”, uma substância que anula a força da gravidade. Bedford encorajou Cavor a pensar nos lucros que sua invenção poderia trazer, e eles trabalharam juntos para construir uma esfera de aço que os levaria à Lua. O restante da história segue aproximadamente a mesma do livro, incluindo o retorno de Bedford e a permanência de Cavor na Lua.
Bedford não sabe como produzir “cavorite”. Cavor ensina os selenitas a produzir a substância e decidem invadir a Terra. Cavor sabota os planos dos selenitas, tudo explode e faz com que a atmosfera da superfície interna e congelada da Lua escape para o espaço. A superfície da Lua é reduzida a um deserto e é essa paisagem estéril que é descoberta pelos astronautas da Apollo 11. Quando o módulo lunar pousa na superfície da Lua, um selenite observa à distância.
FICA A OBRA…
Não se pode exigir que uma obra literária seja fielmente adaptada para as telas do cinema ou da TV devido às dificuldades técnicas que não existem nas páginas de um livro. Enquanto que no livro a imaginação segue seu rumo ao infinito, a obra fílmica precisa respeitar suas limitações. No entanto, em se tratando de outra linguagem, o cinema merece suas considerações. O importante disso tudo é que se buscou manter o máximo possível os personagens principais e o conflito central, algo que, de certa forma, é uma homenagem ao autor do romance.
Por outro lado, fazer uma adaptação atual da obra de H.G. Wells é bastante complicada por dois motivos. Primeiro, a forma como o autor fez com que os dois protagonistas viajassem à Lua pode até ser algo bastante criativo em termos de ficção científica, mas conhecemos maneiras mais modernas para isso. Tudo o que está no romance respeita a sua época de produção, portanto, trazer para os nossos tempos modernos seria um pouco “menos crível”.
O segundo diz respeito ao próprio título, Os primeiros homens na Lua. Como nós sabemos hoje quem foram os primeiros homens na Lua, ficaria um pouco ingênuo o filme. Porém, o filme de 2010 deu uma boa resposta a essa questão. Outros chegaram à Lua antes de uma expedição oficial em 1969. O motivo para que os primeiros a chegarem ao satélite terrestre não terem feito mais vezes esse empreendimento está no próprio livro de Wells, ou seja, o material de cavorite se perdeu e não se soube como produzir mais.
A obra literária tem o seu valor e se constitui em obra clássica da ficção científica. Merece reconhecimento e ser revisitada para se conhecer a trajetória do gênero de ficção científica e como ela inspirou muitas histórias que vieram depois.
Assista ao vídeo sobre esse mesmo artigo, que está no Youtube. Aproveite e se inscreva no canal, acione as notificações, curta o vídeo e deixe o seu comentário.
Paulo Bocca Nunes é professor de Língua Portuguesa e Literatura. Mestre em Letras, Cultura e Regionalidade. Especialista em Literatura e Cultura Portuguesa e Brasileira. Especialista em Cultura Indígena e Afro-brasileira. Escritor. Contador de histórias.